Quero trazer a poesia para a rua
Vê-la descalça a pisar
A terra e as pedras
Sem medo de assumir
A sujidade dos dias/
Quero poemas com cheiro e ruído
Que nos acompanhem pela casa
Sem pejo de ir à casa de banho
Quando é preciso/
Quero as palavras fumegantes
Directamente recebidas dos tachos e das panelas
Ao lume
Com sons de óleo a crepitar na frigideira
E do molho que o esquecimento
Já queimou/
Quero as letras desossadas e indecisas
A agruparem-se umas com as outras
Num acaso feito de desperdício
No balde do lixo/
Quero servi-las à mesa do desconforto
Do fim do dia
E regar-lhes o cansaço
Com bom vinho/
Quero acariciá-las, já desfeitas
Na cinza do cinzeiro
E depois, levá-las para a cama do desejo
E transformá-las em almofadas fofas de sonhos/
E quando acordar de noite
Sobressaltada pelos pesadelos
Quero que elas me abracem
E me renovem
O sentir da realidade/
E quando o meu dia de partida
Chegar
Amortalhem-me com folhas de dicionário
E abecedários lúdicos, desses que se compram
Para as crianças
Quero continuar a brincar com as palavras
No jardim do Além
E, talvez, eu até convença Deus
A tornar-se um poeta
Ana Wiesenberger* (in Dias Incompletos)
*Biografia:
Ana Wiesenberger, de nome completo, Ana Cristina Estrela da Silva Franco Dias Wiesenberger, nasceu em Lisboa em 1962 onde viveu até aos 10 anos, tendo residido desde então em Setúbal. Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas, variante Inglês/Alemão pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa na década de oitenta, tendo posteriormente feito um Pós -Graduação em Estudos Americanos na Universidade Aberta. Lecionou durante mais de vinte anos no Ensino Básico e Secundário em várias escolas na cidade de Setúbal e no Pinhal Novo, estando actualmente reformada por invalidez. Escreveu desde sempre, sendo que as primeiras histórias e textos poéticos surgiram por volta dos onze anos. Planeara sempre dedicar-se à escrita depois da aposentação, porém, nunca perspectivara que a situação acontecesse tão precocemente devido ao aparecimento de uma doença grave. Publicou em 2011 o primeiro livro de poesia, intitulado, Dias Incompletos pela Temas Originais, participou no mesmo ano numa Antologia de Poesia, Poiseis XX pela Minerva com quatro poemas e em 2012, na Feira do Livro de Lisboa foi lançado o seu segundo livro de poesia, Idades pela chancela da Esfera do Caos. Participou ainda numa Antologia de Poesia brasileira, Liberdade, com dois poemas também em 2012. Em 2013 participou na Antologia de Poesia Erótica,Erotismus, Impulsos e Apelos pela Esfera do Caos. Na sua escrita há um registo poético intimista a par e passo de outros poemas mais direccionados para o exterior, nomeadamente na presença forte da natureza enquanto envolvência e partilha. Há ainda uma outra vertente, a poesia dita de intervenção, suscitada pelas vivências de um quotidiano consciente da realidade socioeconómica e política do seu país.
A ambição da autora é que a sua poesia chegue ao homem comum, que não seja apenas abrangida por elites intelectuais, daí a procura constante da língua enquanto veículo acessível à mensagem clara e não fechada e excessivamente cifrada. O poema mais emblemática da estética pretendida é o que dá o nome ao seu blogue, Quero Trazer A Poesia Para A Rua.
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Blogue: querotrazerapoesiaparaarua.blogs.sapo.pt